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terça-feira, 16 de outubro de 2012

O caso da Rádio Comunitária Cidadania e a condenação do comunicador



A dificuldade de obtenção de autorização de funcionamento pelo Ministério das Comunicações estimula o funcionamento das rádios comunitárias sem outorga. O exemplo aqui posto, trata-se da Rádio Cidadania, que é uma Associação Comunitária de moradores pertencentes ao bairro da Terra Firme em Belém que prestava serviços de radiodifusão comunitária aos moradores do bairro Terra Firme, em Belém (PA).

Associação de Radiodifusão Comunitária Cidadania FM (CNPJ 05.980.887/0001-45) localizava-se no Bairro da Terra Firme, Av. Dr. Celso Malcher, nº257. Sua fundação (Estatuto registrado em cartório), deu-se no dia 25 de Março de 2002, quando houve a composição de sua primeira diretoria formada por comunitários. Em seu estatuto é ressaltada a presença da finalidade de “contribuir com a luta pela democratização dos meios de comunicação, pela democratização da informação e pela institucionalização do direito de comunicar”, além de “promover continuamente o debate objetivando o avanço dos projetos comunitários”.
A rádio Cidadania fez o primeiro pedido de outorga para funcionamento em 19 de novembro de 2003, concorrendo ao pedido de habilitação lançado para Belém, sendo, no entanto arquivado em função de falhas processuais justificadas pelo Ministério das Comunicações em alegações de que as coordenadas geográficas indicadas pela rádio não condiziam com a localização da área de cobertura indicada pelas coordenadas na cidade de Belém.


A rádio veiculava campanhas educativas de saúde, em prol da vacinação, por consciência no voto, por conhecimento dos direitos humanos e etc. o que demonstra o comprometimento do trabalho em desenvolver a cidadania e informação de cunho social.

Cientes dos entraves para vincularem a sua programação radiofônica comunitária no ar, a Rádio Cidadania começa a operar ainda em 2002, com freqüência 88.7 MHz e 33 núcleos de programa representados por diversos segmentos sociais organizados.

Contudo, no dia 24 de julho de 2003 a Associação Cidadania FM recebeu a presença de fiscais da ANATEL, acompanhados da Polícia Federal. Nesta operação, adentraram na sede da associação sem qualquer mandado de apreensão ou de prisão e levaram os equipamentos, fato este que ocasionou denúncia contra Osvaldo Mesquita e Marcos Moisés dos Santos.
A denúncia acusa inicialmente de prática de atividade clandestina de telecomunicações – art. 183, da Lei n. 9.472 de 1997 (Lei das telecomunicação). A acusação sustenta-se em dois depoimentos dos fiscais da ANATEL, objetos apreendidos (2 microfones, 2 cd players, 1 md, 1 mesa de som e 1 fone de ouvido) e relatório de gravação da ANATEL. Sendo que, posteriormente a peça acusatória foi aditada, ou seja, acrescida pela acusação do crime de cárcere privado (art. 148 do Código Penal).

Em seu depoimento, Osvaldo Mesquita deixa explícito que os equipamentos apreendidos pertenciam a comunidade associada e que o transmissor que operava era baixa potencia (25 watts), bem como o reconhecimento da função social da rádio para a comunidade do bairro, além do pedido de outorga.

O processo criminal prosseguiu, não sendo ouvida qualquer testemunha de defesa (sob a alegação de que a intimação havia tido desistência, pois não ter sido indicado endereço das testemunhas) e somente com a manutenção de duas testemunhas de acusação, os mesmos técnicos da ANATEL, que assumiam o comportamento ora vítimas, ora testemunhas no caso.
Assim, sem o mínimo de garantia da ampla defesa, os radiocomunicadores foram condenados a pena-base de dois anos de detenção (substituída por serviços alternativos) e multa de dez mil reais pelo art. 183 da Lei 9.472/97, mais sete meses de detenção (pois o crime de cárcere foi desclassificado e a conduta compreendida como crime de constrangimento ilegal, 146 do CPP), bem como perda dos bens em favor da ANATEL. 

A decisão foi recorrida por Osvaldo Mesquita, pedindo reforma da sentença, no que se refere a pena aplicada, sob alegação de não-razoabilidade da pena diante das qualidades benéficas ao réu. Também a alegação de o que o réu é pobre no sentido da lei e da impossibilidade de pagar pena de multa. Além disso, a devolução dos objetos apreendidos, com o argumento de que os bens não eram de propriedade dos réus, mas da associação comunitária, a qual não havia figurado como ré no processo.

O Ministério Público, ainda representado pelo Promotor José Augusto Potiguar, apresentou parecer desfavorável a receptação do recurso, negando a possibilidade de reduzir a pena de multa e fazendo a leitura que o réu não havia apresentado provas de que os objetos de apreensão seriam de propriedade da associação comunitária (em 19 de out. de 2007).
Já em segundo grau, o recurso obteve apreciação parcialmente favorável do Ministério Público Federal, reconhecendo extinção da punibilidade pelo constrangimento ilegal (devido a prescrição retroativa), mas mantendo a pena relacionada ao crime do art. 183 da lei 9.472/97. Essa compreensão foi sustentada na decisão da 3ª Turma do TRF1, emitindo acórdão em 9 de fevereiro de 2010.

Desse acórdão houve recurso para o Superior Tribunal de Justiça (chamado Recurso Especial), que foi negado o pré-questionamento da matéria, como um dos requisitos para ser aceite do recurso. Então, foi feito novo recurso (agravo) para que fosse recebido enfim o recurso especial, que obteve decisão favorável. De forma que se aguarda até o momento a decisão do Recurso Especial (3º grau). 

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